Aumentando a prioridade no Share of Wallet
Amazon Day e a insustentável leveza da escassez
Hey Mavericks,
Como foram as compras? O calendário de promoções é quase como o calendário de feriados, já perceberam? Todo o mês tem uma e sempre estamos torcendo para que alguém invente mais. Mas um alerta que você já sabe: “promoção sempre é promoção alguma” tenha isso em mente.
É como em época de BlackFriday, que se estendem desde outubro até o Natal, como lidar?
Isso me lembra um evento que ocorria durante a celebração do aniversário de São Paulo, em que um bolo quilométrico era montado na rua e várias pessoas ao redor esperavam para pegar um pedaço. Quando era liberado, não sobrava nem um farelo, mas isso não significa que cada pessoa tenha conseguido um pedaço satisfatório.
É como se o bolo fosse o bolso do consumidor e as pessoas, cada marca que tenta ficar com uma fatia.
Não é tarefa fácil ser a preferência, mesmo com uma marca bem construída e uma proposta de valor atualizada. Estamos falando aqui de preço e disputa de preços, e não há argumento racional que sustente essa escolha.
E é nesse contexto que você vai ler na edição 20 da Marketing IS DEAD!:
Marketing stories: A Escassez faz a diferença no share of wallet?
Vale a referência: Milan Kundera
Quote da edição
Segue o fio
MARKETING STORIES: A escassez faz a diferença no share of wallet?
Teste de infidelidade
João Kleber poderia ser o apresentador perfeito para este relatório que parece um teste de fidelidade de consumo. Como se passeando entre gôndolas de um supermercado, o apresentador estivesse à espreita para gritar “para, para, para” a cada avanço de um consumidor ávido com prateleiras cheias de produtos que nunca estiveram em sua dispensa.
Poderia também ser um quadro patrocinado pelo TikTok dada a quantidade de novas possibilidades que esse consumidor se abre.
O que acontece é que ele está menos leal e mais propenso a experimentar, segundo o relatório Brand Footprint LATAM 2023, produzido pela Kantar, tudo por conta do cenário econômico. Veja o que diz o estudo:
Queda na lealdade dos consumidores pelas marcas: O poder de compra dos consumidores na América Latina diminuiu em 25% nos últimos dois anos devido à inflação. Isso levou as pessoas a racionalizar suas compras e buscar melhores preços.
O Aumento nas escolhas de marcas: Os consumidores latino-americanos estão visitando 18% mais canais de compras e comprando, em média, 93,4 marcas em 2022, em comparação com 2021. Isso ocorre porque eles estão avaliando o custo-benefício de cada marca
Sucesso das pequenas e médias empresas: As pequenas e médias empresas estão conquistando 71% da região, mostrando seu potencial na luta pela atenção do consumidor. Essas empresas têm um desempenho melhor em comparação com as marcas maiores, com um equilíbrio de 50% de crescimento e 50% de retração, em comparação com 40% e 60%, respectivamente, das marcas maiores.
Importância da penetração de marca: A penetração, ou seja, o número de pessoas que compram determinada marca, é fundamental para o crescimento das empresas na região, especialmente quando a fidelidade do consumidor diminui.
Desempenho das marcas mais compradas: Entre as marcas mais compradas na América Latina, apenas uma está crescendo. Coca-Cola ocupa o primeiro lugar, seguido por Colgate, Bimbo, Pepsi e Grupo Lala. Apenas a Pepsi conseguiu aumentar seu CRP (Consumer Reach Points) em 2%.
De certo, não há caminho fácil por aqui, e como você pôde notar, o comportamento de consumo é altamente impactado pela volatilidade econômica, mas, apenas para você entender a dimensão do mercado em que estas marcas e produtos estão disputando o bolso do mesmo consumidor, estes achados são baseados em dados coletados de mais de 5 mil marcas locais e 37 mil marcas globais, abrangendo 14 mercados na América Latina.
A pergunta que fica é: o primeiro pedaço do bolo vai pra quem?
Sem medo de share of wallet
O conceito de "share of wallet" é bastante simples. Tanto é assim que, se você leu até aqui, há uma grande chance de que a imagem de um bolo sendo dividido esteja ainda na sua mente, pois é exatamente isso que representa.
Não há uma forma mais simples de explicar esse conceito, que, na prática, mostra o quanto do dinheiro de um potencial consumidor está sendo gasto entre uma empresa ou outra.
Vai querer um pedaço? Se não fizer nada, ficará sem nenhum.
Considere, então, o contexto que o relatório apresentou e perceba que não existe branding que garanta para todos uma participação crescente, ou mesmo consistente, no mercado. E olhe que eu sou um grande defensor desse diferencial e dupla indispensável das estratégias de marketing, como você pode ler nesta edição e também nesta aqui.
Não é nem surpresa que a Coca-Cola esteja no topo do ranking, por exemplo, mas e quantas outras ficam nessa dança de cadeiras de consumidores que estão experimentando mais e redistribuindo sua carteira, que está menor.
É como onde cabiam 4 produtos, agora só coubessem 3 sendo que 1 deles ocupasse o espaço de dois. Se a conta confundiu, é exatamente essa sensação, muita fricção na tomada de decisão leva para o item com maior facilidade de mensurar o impacto.
Quem gosta de games sabe que organizar o inventário querendo manter um item premium é uma dor de cabeça e, acredite, dor de cabeça é a última coisa que queremos dar a este consumidor em crise.
Para isso, é necessário reduzir a fricção para a tomada de decisão se você quer ser prioridade no share of wallet e manter um produto no inventário deste consumidor.
Mas como?
A incrível leveza da escassez
O paradigma da escassez é uma estratégia de marketing baseada na ideia de que as pessoas querem o que não podem ter. É por isso que produtos de edição limitada ou ofertas relâmpago podem ser tão eficazes.
Ao criar uma sensação de urgência, você pode incentivar os consumidores a comprar agora ou arriscar perder a oportunidade. E vamos falar a verdade, algum de nós gosta de perder alguma oportunidade?
Aqui, é onde podemos explorar as possibilidades de como apoiar a resolução do cliffhanger anterior a partir de alguns exemplos usando esta estratégia:
Produtos de edição limitada ou produção reduzida proporcionam uma sensação de urgência moderada, mas elevado sentimento de exclusividade que faz com que produtos de ticket maior sejam competitivos, sendo potencializados pela estratégia de Branding.
Nesses casos, o ticket alto cria um compromisso de maior porcentagem no share of wallet do consumidor, que fica comprometido com a sua marca e gera uma barreira de entrada de outras marcas que atuam com o mesmo patamar de preço, criando indiretamente um ganho de lealdade (esse é o primeiro gatilho que pode ser usado em um cenário saturado, como relatado).
Ofertas relâmpago ou vendas de curto prazo podem levar a compras por impulso, semelhante ao FOMO (Fear of missing out, ou medo de ficar de fora de algo), a mesma sensação que levou todo mundo a se envolver com o Threads ou comentar sobre a campanha da Volkswagen com a Elis Regina, que você pode ler com calma nesta edição e também nesta edição.
Nessa tática, em que você gastou a maior parte do seu share of wallet no Amazon Day - Confesse!-, há uma oportunidade complementar e anterior à oferta, associada a uma wishlist: Engajar com o cliente antecipadamente para gerar demanda sobre o seu produto, reduzindo a fricção da compra por impulso, aumentando as chances, entre tantas outras ofertas relâmpago, que a sua esteja na frente.
Acesso antecipado pode ser uma ótima maneira de criar entusiasmo por um novo produto ou de recompensar clientes que tenham um LTV maior ou sejam mais engajados com a marca.
Nesse caso, seria como hackear ou tentar bloquear a queda de lealdade em relação ao produto/marca. Considere que ela é como um nível tier 3 que, se usada em conjunto com um dos dois exemplos anteriores, aumenta consideravelmente a prioridade no share of wallet desse consumidor.
Imagine que você é informado de que haverá uma oferta relâmpago de apenas algumas unidades e que você terá acesso antecipado a ela. Se isso não aumentar a prioridade ou a lealdade à marca, estaremos diante de uma crise sem precedentes no mercado. 😂
Para ampliar a conversa e buscar insights extras, podemos explorar alguns outros casos de uso, por exemplo, de empresas que enfrentaram desafios semelhantes e se apoiaram na escassez e em hacks de share of wallet para aumentar a lealdade de marca:
Magazine Luiza: Em novembro de 2021, durante a Black Friday, portfólios de produtos tiveram descontos de até 80% com duração de apenas 24 horas em todos os canais. Além disso, no dia anterior, foi realizado um evento especial com o apresentador Luciano Huck e vários cantores famosos, como Anitta e Jorge e Mateus. O objetivo era tornar-se o marketplace preferencial e já começar a ganhar share desde o início do mês, além de manter esses consumidores engajados na virada do dia com os shows. Legal, né?
Havaianas: Em 2019, fizeram uma edição limitada a quase R$200 em uma parceria com a grife francesa Saint Laurent e mais recente, criaram edições limitadas com artistas selecionados em comunidades. Seja o motivo de consumo, eles conseguem renovar o portfólio mantendo a expectativa e um share of wallet reservado para estas edições.
Coca-Cola: lançamento de uma edição especial de latas com nomes personalizados. Esta tenho certeza que você lembra e, inclusive, também conhece alguém que nunca achou seu nome como meu pai que chama Richard. Ficou com Ricardo mesmo. Ah, mas falando sobre a estratégia, perceba que mesmo uma líder de mercado absoluta também precisa continuar incentivando a lealdade à marca.
Currys: A loja inglesa criou uma fila virtual para acesso ao site durante a Black Friday, essa é uma estratégia de escassez que deu errado e deixo para o comentário do próprio cliente @HoldMichaels que foi ainda mais enfático. "30 minutos para entrar no site da Currys? Para conseguir um desconto de £5 em um cabo HDMI que custará £80? Página fechada" vi aqui.
DisneyPlus: Oferta sua assinatura atrelada ao plano premium do Mercado Livre a um preço comparável ao que a Amazon tem como proposta de valor em seu plano simulando o combo “Streaming+marketplace”.
Te pareceu estranho comentar esses casos pensando em share of wallet em vez de falar sobre estratégias de UX, marketing, produto, design ou vendas isoladamente?
Mas vamos refletir um pouco sobre porque você consideraria que uma estratégia pode funcionar sozinha sem estar alinhada aos objetivos de negócios.
Criar um funil para gerar relatórios de leads sem considerar o esforço de vendas posterior ou o suporte ao cliente é ignorar que não trabalhamos em silos, mas sim como um esforço coletivo para a sustentação da empresa.
"Ou você morre como herói, ou vive o bastante para se tornar o vilão" - Harvey Dent
Agora, imagine que toda essa estratégia seja tão eficiente que se inverta e comece a criar mais desafios operacionais do que o negócio suporta. Demanda demais o santo desconfia. E agora, o que fazer nesses casos?
Como fazer com que a jornada de compra funcione nestas estratégias
Tenho certeza de que você já se frustrou com alguma compra.
Lembro-me de uma vez, durante o auge das plataformas de venda de cupons, que era uma forma dos negócios locais, geralmente restaurantes, aumentarem sua demanda a partir de um “tiro de canhão” com o alcance que estas plataformas tinham. Todo mundo comprava cupons.
Comprei um também para conhecer um novo restaurante mexicano e fui, feliz, com minha esposa. No local, não apenas o restaurante não era nada do que mostravam as fotos no site, mas também não tinha mesa para o dia que eu reservei. O que aconteceu?
Criou-se uma demanda muito grande e impactou toda a operação que não conseguiu atender o “pós-captura”. Poxa, fizeram por merecer meu share of wallet e no fim perderam um cliente.
Outro caso foi em uma Black Friday recente, a de 2022. Estava ali parado em uma wishlist um secador de cabelos e, logo que o dia começou, fui impactado por uma oferta relâmpago de um marketplace concorrente. Era uma oferta muito mais vantajosa e decidi comprar de lá.
Fui um consumidor infiel e sem lealdade da marca, eu sei, mas você consegue ver agora que essa troca e experimentação é muito mais simples do que parece, mas, conquistaram meu share e novamente perderam um cliente. Nunca recebi o produto e não consegui contato por nenhum canal, e isso até hoje.
De que adianta gerir uma estratégia em que consumidores ficam tão ansiosos para colocar as mãos em um produto e que também na ansiedade de vender, sobrecarregam a equipe de vendas, o suporte e o atendimento, e quem sabe até a cadeia logística?
Frustração para todos os lados, tanto para os clientes quanto para os próprios funcionários.
O site Reclame Aqui não surgiu por conta de elogios, por incrível que pareça. (Contém ironia)
Para reduzir esses problemas, é necessário garantir, em uma estimativa, uma demanda realista para que os recursos necessários estejam disponíveis. Além disso, é preciso ter uma equipe de vendas, suporte e CS alinhados com a estratégia para poderem gerenciar a demanda gerada de forma eficaz.
No fim, a escassez pode ser uma estratégia incrível para aumentar o share of wallet e promover lealdade à marca.
No entanto, é importante implementá-la de forma ética e responsável, garantindo que os clientes se sintam valorizados e não manipulados.
Ao equilibrar a escassez com outras estratégias, você pode pensar em campanhas que atendam os objetivos de negócio de um ano sem esquecer que no próximo, aquele consumidor irá entrar novamente em um ciclo de tomada de decisão. Será que ele vai escolher você para o primeiro pedaço?
Acionáveis/Unlockable desta edição
Entender e adaptar a estratégia de acordo com o contexto do consumidor. Isso significa que você pode dedicar tempo para pesquisar e entender o público-alvo, suas necessidades e comportamento afim de mapear o que é gatilho e o que é empecilho (Gostou desta palavra de 1900?)
Utilizar a escassez como uma estratégia poderosa para aumentar o share of wallet e promover a lealdade à marca, mas implementá-la de forma ética e responsável. Isso significa que você não deveria manipular os consumidores criando escassez artificial.
Reduzir a fricção no processo de tomada de decisão dos clientes também é crucial para aumentar sua prioridade no share of wallet. Isso pode ser alcançado através da simplificação do processo de compra, oferecendo informações claras e concisas e fornecendo fácil acesso ao suporte ao cliente.
Criar uma sensação de urgência também é uma forma eficaz de incentivar os clientes a comprar. Isso pode ser feito através de ofertas com tempo limitado, produtos exclusivos e outros incentivos que criem uma sensação de urgência e façam os consumidores se sentirem como se precisassem agir rapidamente.
Garantir que os recursos necessários estejam disponíveis para atender à demanda gerada pela estratégia implementada. Isso inclui ter estoque suficiente, pessoal e suporte para lidar com o aumento de clientes e atender às suas necessidades.
Ter uma equipe de vendas, suporte e atendimento ao cliente alinhada com a estratégia também é fundamental para gerenciar a demanda gerada**.** Isso significa que você deveria garantir que suas equipes estejam treinadas e equipadas para lidar com o aumento da demanda e fornecer um atendimento ao cliente de alta qualidade para manter a satisfação do cliente.
Equilibrar uma estratégia com outras táticas para criar campanhas que atendam aos objetivos de negócios e valorizem os clientes. Isso significa que você não deve depender exclusivamente da escassez, por exemplo, para impulsionar as vendas.
VALE A REFERÊNCIA
Essa semana tivemos a partida do quase Nobel de Literatura, Milan Kundera.
Confesso que tive pouco contato com a obra de Kundera mas tenho certeza que irei agredecer quando me aprofundar mais, as características filosóficas, estilo de narrativa e profundidade de personagens que me contaram são já indicam um wishlist garantida. Quem sabe não serei impacto agora por uma flash sale?
Só tenho a aprender em narrativas assim, que exploram questões existenciais e políticas, que por si só são densas mas como ele muitas vezes usa a história da Tchecoslováquia como pano de fundo, é como um tempero a mais para viajar na leitura e se perder em novos panoramas. Sempre há um insight aguardando em alguma página.
Gostao quando falam que um autor ganha “destaque internacional”, como se isso fosse necessário para validar sua competência mas, pelo menos, faz com que com seus romances mais aceitos, "A Insustentável Leveza do Ser" (1984) e "A Brincadeira" (1967) possam continuar influenciando e provocando por longos e longos anos.
Então, como um bo curioso que começa com buscas pequenas para depois ir se aprofundando segue alguns links úteis para saber mais sobre o autor e suas obras que me deparei:
Biografia - https://www.britannica.com/biography/Milan-Kundera
Página oficial de Milan Kundera - http://www.kundera.de
Wikipedia - https://en.wikipedia.org/wiki/Milan_Kundera
QUOTE DA EDIÇÃO
“Quando a coisa puder ser feita, faça-a. Se não fizer, ela não existe” - Paul Arden
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See you, space cowboy.